LIVRE ESCOLHA
₢ Dalva Agne Lynch
Como todos deveriam saber, para que alguém seja rico, alguém precisa ser pobre - não há patrões sem empregados, fazenda sem peões, teatro sem coxia.
A partir daí, o que cabe tanto a patrões quanto a empregados, dirigentes e povos, ricos e pobres, é uma coisa só: atitude perante seu lote na vida. Ninguém precisa se contentar em ser peão. Todos podem lutar para subir ao topo, e é esta a essência de uma sociedade livre.
Se o homem tivesse se contentado com o que tem, não teríamos progresso, nem criação artística. O que difere o homem dos animais não é ter um cérebro. Animais também o têm. O que difere o homem dos animais é a sua capacidade de ir além de si mesmo e de seu meio-ambiente através de suas escolhas.
O que difere o homem dos animais, e, por sinal, o que o difere dos anjos, é o LIVRE ARBÍTRIO - a capacidade de fazer escolhas a um nível transcendental.
Isto é o que D´us quis dizer quando disse: "O homem agora é um de nós, conhecedor do bem e do mal". Nós, todos nós, somos deuses, porque temos a capacidade de escolha - de livre arbítrio.
Você pode argumentar que o animal também escolhe, ao preferir uma comida a outra; que as plantas também escolhem, ao voltarem-se na direção do sol. Mas a escolha à qual estou me referindo não é a escolha entre o que é bom e o que é mau (note os adjetivos). Este tipo de escolha faz parte da carga genética de cada ser vivo, e que faz com que um cãozinho não coma alimento estragado, ou que uma planta cresça em direção à luz.
Estou me referindo à escolha maior, a escolha transcendental entre o Bem e o Mal - substantivos.
Ora, se o homem pode escolher entre duas coisas, entre o que para ele parece ser o bem, e o que lhe parece ser o mal, ele vai buscar (ou deveria buscar) a superação do mal. Este tipo de escolha pressupõe insatisfação transcendental, que difere da insatisfação visceral que compartilhamos com os demais seres vivos.
Partindo daí, podemos dizer que ninguém escolhe outra coisa se está satisfeito com o que tem. E isto nos leva ao seguinte ponto, por dedução lógica: insatisfação com seu lote faz parte da carga humana. O homem foi criado para superar o que a vida lhe entrega. O homem foi criado INSATISFEITO.
E é esta insatisfação que leva o ser humano ao que o define: ele é capaz tanto de CRIAR, quanto de DESTRUIR, mas sua verdadeira essência é, ou deveria ser, o fato de que ele é o único, em toda a criação, capaz de escolher, sem condicionamento pavloviano, NÃO DESTRUIR.
Todo ser vivente é capaz de destruição. Veja o que pode fazer um lindo cãozinho solto no meio de seus sapatos. Vocè pode condicioná-lo a não ser destrutivo - mas isto é condicionamento, não é livre escolha. O cachorrinho pode escolher não destruir seus sapatos porque teme a represália, o castigo. Ele não escolhe apenas porque ama você.
APENAS O HOMEM PODE ESCOLHER ENTRE O BEM E O MAL, ENTRE CRIAR E DESTRUIR - e é em função disto, e somente por isto, que um ser humano pode ser julgado como sendo BOM ou MAU.
O resto - riquezas, fama, sucesso - são meros assessórios. A riqueza seria errada, se fruto do roubo, da mentira, do engodo. A fama seria errada, se, para chegar lá, a pessoa pisou sobre quem lhe estava no caminho. O sucesso seria errado, se subir à cabeça e tornar a pessoa socialmente inútil. Fora disto, riqueza, fama e sucesso deveriam ser o resultado da luta pessoal do homem para superar a si mesmo, e, neste contexto, seu direito inalienável.
Outros escritores mais hábeis do que eu já dissertaram ad nauseum sobre este assunto. Nivelar econômica e culturalmente a humanidade é impossível, porque não lhe coibe a criatividade e a sua inerente força de superação. E todo grupo, seita ou nação que busca a igualdade econômico-social de seus membros está fadada ao fracasso ao longo do tempo.
A humanidade, seja ela um povo, um conglomerado ou até mesmo um grupo de internet, não é uma massa informe a ser moldada a partir de um modelo: é um conjunto de mentes possuidoras de livre-arbítrio, com todos os problemas sociais, econômicos e culturais que isto pode acarretar.
O dirigente sábio ofereceria condições de aprendizagem e superação àqueles que dirige. O néscio forçaria regras de igualdade e adaptabilidade a um todo ilusório e inexistente, e, com isto, fomentaria a revolta dos que não se submetem.
Resta ver onde queremos nos encaixar: entre homens livres, ou entre fantoches.