Dalva Agne Lynch
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Textos
Tradução abaixo do original em inglês
 
 


Last Will and Testament In Vita
(March 7, 2005 - four months before I died for 9 min, 49 sec.)




Today I began seeing the world from another perspective. Not like a world  which I don´t want to belong to, but a world which I don´t  need to belong to, and to which one day I will not belong anymore – I don´t know when, but I hope it´ll not be long.
 
So I started making a list of everything I want to do here while I still can – things like painting the pictures I have in my mind, pictures that don´t relate to anything one can see with one´s eyes, but that make all the sense to me.
 
Today I´ve committed myself to keep on telling people how beautiful they are, each in his or her own way, without feeling ashamed of what they`ll think of me. And also to continue liking wild flowers better than orchids or lilies, and surrounding myself with children rather than rotten wise men, and reading Harry Potter instead of philosophical treatises. And I´ll not be ashamed of saying how pompous and boring they are!
 
Today I´ve promised myself I´ll live every second as if there won´t be another, and not by fear that there won´t be another but because I know it´s very likely there will be, but when it comes – if it comes – I can still hope it´ll be my last.
 
Today I´ll not care if they call me stupid because my favorite movie is “Artificial Intelligence”, in which men created a boy to love but forgot to create someone to love him back. And because my favorite book is “The Land of the Bald Children”, by Graciliano Ramos, in which a boy dives into a river to find other kids who were like him. Oh, and because I feel like crying when I listen to Christmas songs, since it was on a Christmas long time ago that I had my last few moments of innocent happiness – before I learned that evil is real.
 
Today I´ve promised myself I´ll publish all my stories and poems, because they, beside my children and my pictures, are my inheritances to those who – like me – see the world like a school-prison from where we for sure will escape, by age or by finishing the course.
 
Today I´ll go to bed happy because from everything they took away from me, from all the goodbyes I had to say, from all the loves I´ve  lost, there´s one thing no one can ever take away from me, because it´s my birthright: I have the right to perish.
 
But when I lay to be no more, may they scatter my ashes in the heather hills of Scotland, as they play the theme of Tchaikovisky`s Swan Lake. Later, may they put some place that picture of me (a very bad picture!) dancing, and write, in Gothic letters: “A Fool, she lived in words, colors and gestures, even if no one understood.”


 
 


Tradução



 
Testamento In Vita
(7 de março de 2005 - quatro meses antes de morrer por 9 minutos e 49 segundos)




Hoje comecei a ver o mundo sob outra perspectiva. Não como um mundo do qual eu gostaria de não pertencer, mas um mundo do qual não preciso pertencer, e ao qual um dia não vou pertencer - quando não sei, mas espero que não demore muito.

Então comecei a fazer uma lista de tudo o que quero fazer aqui, enquanto ainda posso - coisas como pintar as figuras que tenho na mente, sem qualquer relação com o que se vê com os olhos, mas que fazem sentido para mim.

Hoje me comprometi a continuar a dizer às pessoas quão bela cada uma é, a seu próprio modo, sem sentir vergonha do que vão pensar de mim. E continuar a gostar mais das flores do campo do que de orquídeas ou lírios, de me cercar de crianças ao invés de carcomidos sábios, de ler Harry Potter ao invés de tratados filosóficos. E não vou ter vergonha de dizer como eles são enfadonhos e pomposos!

Hoje me prometi viver cada segundo como se não houvesse um seguinte, não por medo de que não haja um seguinte, mas porque sei que é bem provável que haja. Mas que, quando ele vier - se vier, é claro -  ainda posso esperar que seja o último.

Hoje não vou me importar de que me chamem de idiota porque meu filme preferido é "Inteligência Artificial", onde criaram um menino para amar, mas se esqueceram de criar alguém que o amasse. E que meu livro preferido é "A Terra dos Meninos Pelados", de Graciliano Ramos, onde um menino mergulha no rio para encontrar quem se assemelhasse a ele. Ah, e que tenho vontade de chorar quando escuto músicas de Natal, porque foi em um Natal que tive meus últimos dias de felicidade inocente – antes que aprendesse que a maldade é real.

Hoje me prometi publicar todos os meus textos, sejam em prosa ou verso, porque eles, além de meus filhos e meus quadros, são minha herança para aqueles que, como eu, veem o mundo como uma prisão-escola, de onde, por seguro, vamos sair – seja por idade, seja por terminar o curso.

Hoje vou me deitar feliz, porque de tudo o que já me tiraram, de todos os adeuses que já tive que dar, de todos os amores que se me perderam, jamais me poderão tirar este único direito inalienável: ninguém jamais poderá me tirar o direito de perecer.

Mas quando eu me deitar para não mais me levantar, que minhas cinzas sejam espargidas nos montes cobertos de urzes violetas na Escócia, ao som do Lago dos Cisnes de Tchaikovsty. Mais tarde, que seja colocada em algum lugar a  foto  - mal tirada! - de mim dançando, e, em letras góticas, se escreva: “Louca, ela viveu de palavras, cores e gestos, ainda que ninguém os compreendesse”.

 







 
Dalva Agne Lynch
Enviado por Dalva Agne Lynch em 12/04/2014
Alterado em 02/10/2021
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